Trecho do livro
[...] Quanta coisa absurda pode acontecer na cabeça, querer bem já sem conseguir querer bem, querer mal mesmo continuando a querer bem. Comigo aconteceu, por isso evitei a palavra o mais possível, não sei o que fazer com o amor seráfico, o amor que conforta, o amor que toca os sinos, o amor que purifica, o amor patético: é por estranheza que a usei tão pouco durante minha longa vida. Entretanto usei muitas outras — agonia, fúria, languidez, abatimento, necessidade, urgência, desejo —, demasiadas, temo, que pesco em cinco mil anos de escrita, e poderia seguir adiante quem sabe quanto. Mas agora tenho de passar a Teresa, foi ela quem
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[...] Quanta coisa absurda pode acontecer na cabeça, querer bem já sem conseguir querer bem, querer mal mesmo continuando a querer bem. Comigo aconteceu, por isso evitei a palavra o mais possível, não sei o que fazer com o amor seráfico, o amor que conforta, o amor que toca os sinos, o amor que purifica, o amor patético: é por estranheza que a usei tão pouco durante minha longa vida. Entretanto usei muitas outras — agonia, fúria, languidez, abatimento, necessidade, urgência, desejo —, demasiadas, temo, que pesco em cinco mil anos de escrita, e poderia seguir adiante quem sabe quanto. Mas agora tenho de passar a Teresa, foi ela quem sempre se recusou a estar dentro dessa combinação de quatro letras e no entanto as quis para si, e ainda quer, milhares e milhares de outras.
Eu tinha uma queda por Teresa desde que ela se sentava numa cadeira perto da janela e era uma das minhas alunas mais animadas. Mas só me dei conta disso quando, depois de um ano de formada, ela me ligou, veio me esperar na saída da escola, me falou de sua turbulenta vida universitária caminhando num belo dia de outono e de repente me beijou. Aquele beijo foi o marco inicial do nosso relacionamento, que durou ao todo uns três anos, entre exigências de fato nunca satisfeitas de absoluta posse recíproca e tensões que terminavam em insultos, choros e mordidas.