[N.A.] Carlos Eduardo Pereira compartilha aqui seu diário da quarentena

Por Equipe Todavia

 

Seguimos com a nossa programação do [N.A.]* —  seção na qual escritoras e escritores, designers gráficos, ilustradoras e ilustradores, tradutoras e tradutores compartilham, no nosso site, o que eles desejam sobre o período de isolamento.

*Emprestamos a abreviação “nota do autor” porque são essas autoras e esses autores que, por meio de suas criações, nos ajudam a construir a editora, diariamente. Todas as terças e sábados, você verá no nosso site o que nossa turma escolheu compartilhar.

#VamosVirarEssaPágina

 

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Carlos Eduardo Pereira, autor de ENQUANTO OS DENTES, escreve sobre o primeiro dia em que as pessoas puderem sair às ruas:

 

Desconfinamento


Depois do lockdown por tantos meses tá sendo uma bênção finalmente colocar o nariz pra fora desta casa, encher os pulmões com ar puro, a minha janela não recebe nem o sol da manhã nem o da tarde, hoje é o primeiro dia em que as pessoas vão poder sair às ruas, o governo se apressou em divulgar certas listas de bairros cujos moradores estarão liberados pra circulação num raio de doze quilômetros em torno de seus domicílios, uns bairros nos dias ímpares e outros nos pares, desci pelas escadas pra evitar o espaço encaixotado de um elevador, na rua encontro cada um sentindo a vida do seu jeito, tem quem gargalhe, tem quem chore, eu apenas fecho os olhos pra tentar captar a energia em movimento, o porteiro do prédio da frente não parece me ver, assim como os outros vizinhos não parecem me ver, mas vem vindo em minha direção um tio meu de Minas, veja só, e outros conhecidos de outros lugares que eu não poderia encontrar por aqui, meu tio vem chegando pra um abraço e acho lindo isso, mas não sei o que acontece, é um abraço que não tem calor.

 

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Carlos Eduardo Pereira nasceu no Rio de Janeiro em 1973. ENQUANTO OS DENTES é seu primeiro romance.


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