A ERA DO COMETA e cinco figuras marcantes da Primeira Guerra Mundial

As diferentes relações e reações com o fim da guerra

Há cem anos, em novembro de 1918, a Primeira Guerra Mundial chegou ao fim, mas era somente um ponto de partida para lutas e crises que viriam a seguir. Foram anos de reconstrução e muita produção artística, intelectual e política.

ERA DO COMETA, de Daniel Schönpflug, é uma grande viagem que tem como lente histórias de diferentes personagens, a partir de seus relatos, cartas e biografias. Com graça e leveza, misturando política, cultura e vida cotidiana, recupera o espírito de uma época que inaugurou a modernidade.

Selecionamos aqui cinco figuras do livro que, como conta Schönpflug, tiveram diferentes relações e reações com o fim da guerra.

 

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Louise Weiss • França
[jornalista, escritora e política]


Passou a vida trabalhando como jornalista e combatendo pela causa de uma Europa unida e pelos direitos das mulheres.

"Só depois de certo tempo finalmente a curiosidade vence Louise Weiss naquele 11 de novembro de 1918 e a jornalista desce pela escadaria para ver com os próprios olhos a “loucura” dos parisienses. Ao chegar à rua ela é arrebatada pela multidão que “urrava de alegria e de ódio”. Olha por sobre um mar de gente, acima do qual tremulam milhares de bandeiras francesas e estadunidenses. Os soldados são carregados sobre ombros pelas ruas. Um tumulto de fanfarras, de armas tomadas ao inimigo, de beijos, de danças jubilantes e também de mulheres enlutadas. A Louise tudo aquilo parece repugnante. Pior ainda: tolo. Ainda que ela esperasse muito pela vitória, essa celebração da agressividade e essa apoteose do massacre lhe parecem atos de barbárie."

 

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George Grosz • Alemanha
[pintor]


Através de sua arte, analisou e criticou a situação política e social da Alemanha. Em 1932, mudou para os Estados Unidos, antevendo a ascensão do nazismo.

"Quando as notícias sobre o fim das lutas no front ocidental chegaram à capital Berlim, Grosz ainda tinha a impressão de que a guerra nunca terminaria realmente. “Talvez não tivesse mesmo terminado? Entre nós havia sido decretada a paz, mas nem todos estavam bêbados e felizes. Na verdade, as pessoas permaneciam as mesmas, apenas com algumas diferenças: o soldado alemão, antes tão orgulhoso, tornara-se um soldado exausto e derrotado e o Exército se esfacelara tanto quanto os uniformes cujos tecidos continham celulose e os cinturões de munição feitos de couro artificial. Que aquela guerra tivesse sido perdida não eraalgo que me deixasse decepcionado. Só o que me decepcionava era o fato de que as pessoas a tinham tolerado e suportado por anos a fio, e de que ninguém dera ouvidos às poucas vozes que tinham se erguido contra os massacres."

 

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Harlem Hellfighters • Estados Unidos
[soldados]


Infantaria do Exército dos EUA, seus soldados lutaram ao lado dos Aliados nas linhas de frente da Primeira Guerra Mundial.

"Os soldados norte-americanos que nela servem, e que se encontram sob o comando francês, provêm da Guarda Nacional de Nova York. A maior parte deles é de afro-americanos do bairro nova-iorquino do Harlem. Para os Estados Unidos não foi fácil transformar negros em soldados. Só a brutal demanda por homens ocasionada pela guerra mundial fez com que eles cruzassem o Atlântico para lutar. Sua formação não poderia ser comparada à de outros soldados. Eles tinham sido obrigados a passar pelo treinamento em lugares públicos, em ginásios desportivos e em salões de baile no Harlem, usando pás e cabos de vassoura em vez de armas verdadeiras. Poucos dentre eles foram designados para posições de comando. Quantos olhares tortos, observações cheias de desprezo e gestos humilhantes eles tiveram que suportar num país onde a escravidão havia sido abolida poucas décadas antes e onde a discriminação e os conflitos raciais se encontravam na ordem do dia?"

 

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Virginia Woolf • Inglaterra
[escritora]


Noite e dia, livro que foi publicado no início de 1919, testemunha as questões que a guerra despertou em Virginia Woolf.

"Também há pouco entusiasmo na casa dos Woolf quando, no dia 11 de novembro, às onze horas, se ouve em Richmond o trovejar de canhões. Virginia escreve em seu diário: 'Os corvos esvoaçavam & por alguns instantes se pareciam com criaturas simbólicas realizando algum tipo de cerimonial em parte de gratidão, em parte de despedida num túmulo. Um dia encoberto e silencioso, a neblina desliza em direção ao leste; & isto também se parece, por alguns instantes, com algo vacilante, que acena de maneira tristonha'. Ouvem-se também algumas sirenes, que soam para marcar aquele momento."

 

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Gandhi • Índia
[político]


Foi advogado e político indiano, fundador da Índia independente.

"Enquanto suas forças vitais retornam aos poucos, Gandhi se vê confrontado com uma notícia política alarmante. Com o final da guerra, as leis correspondentes ao estado de exceção, por meio das quais os ingleses puderam manter o crescente movimento independentista indiano sob controle durante os anos de guerra, se tornaram obsoletas. Para compensar essa situação foi criada uma comissão, chefiada pelo juiz Sir Sydney Rowlatt, que elaborou um pacote de leis que tem como objetivo principal assegurar às autoridades britânicas o comando diante de distúrbios públicos. Gandhi começou a organizar o movimento de resistência a essas leis tão logo ficou sabendo que estavam sendo preparadas."

 

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Bate-papo de lançamento com o autor Daniel Schönpflug e Tércio Loureiro Redondo, professor de literatura alemã da USP, quarta-feira (5), às 19h, no Goethe-Institut São Paulo. Saiba mais aqui.

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