Trecho do livro
Um dos problemas clássicos de minha disciplina — a filosofia — é a relação entre mente e matéria. Como a senciência, a inteligência e a consciência se encaixam no mundo físico? Neste livro, quero avançar na solução desse problema, por mais vasto que seja. Para abordá-lo, sigo um percurso evolucionário; quero saber como a consciência emerge da matéria-prima encontrada nos seres vivos. Éons atrás, os animais constituíam apenas um entre os vários grupos desregrados de células que começaram a viver juntas como unidades, no mar. De lá, no entanto, algumas adotaram um estilo de vida particular. Tomaram o caminho da mobilidade e da ativida
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Um dos problemas clássicos de minha disciplina — a filosofia — é a relação entre mente e matéria. Como a senciência, a inteligência e a consciência se encaixam no mundo físico? Neste livro, quero avançar na solução desse problema, por mais vasto que seja. Para abordá-lo, sigo um percurso evolucionário; quero saber como a consciência emerge da matéria-prima encontrada nos seres vivos. Éons atrás, os animais constituíam apenas um entre os vários grupos desregrados de células que começaram a viver juntas como unidades, no mar. De lá, no entanto, algumas adotaram um estilo de vida particular. Tomaram o caminho da mobilidade e da atividade, criaram olhos, antenas e meios para manipular objetos à sua volta. Evoluíram para o rastejar dos vermes, o zumbido dos mosquitos, as viagens globais das baleias. Como parte de tudo isso, em algum estágio desconhecido, veio a evolução da experiência subjetiva. Para alguns animais, há algo que os faz sentir como é ser aquele animal. Existe algum tipo de “eu” que vivencia o que está acontecendo.
Estou interessado na forma como a experiência de todas as espécies evoluiu, mas os cefalópodes terão importância especial neste livro. Em primeiro lugar, por serem as criaturas notáveis que são. Se pudessem falar, poderiam nos contar muita coisa. Mas não é só por isso que eles escalam e nadam tanto neste livro. Esses animais deram forma a meu percurso, através de problemas filosóficos; segui-los cruzando o mar, tentar elucidar o que estão fazendo, tornaram-se parte importante de meu roteiro. Quando abordamos questões relativas à mente dos animais, é fácil ser demasiadamente influenciado pelo nosso próprio caso. Quando imaginamos as vidas e experiências de animais mais simples, frequentemente acabamos visualizando versões miniaturizadas de nós mesmos. Os cefalópodes nos põem em contato com algo muito diferente. Como o mundo parece ser para eles? O olho de um polvo é semelhante ao nosso. É formado como uma câmera, com uma lente ajustável que foca uma imagem na retina. Os olhos são semelhantes, mas os cérebros por trás deles são diferentes em quase todos os outros parâmetros. Se quisermos compreender outras mentes, as mentes dos cefalópodes são as mais outras de todas.