Trecho do livro
A primeira coisa que posso dizer a vocês é que morávamos no sexto andar sem elevador e que, para Madame Rosa, com todos os quilos que carregava junto com ela e apenas duas pernas, isso era uma verdadeira fonte de vida cotidiana, com todas as preocupações e mazelas. Ela sempre nos lembrava disso todas as vezes que não ia se queixar em outras bandas, pois era igualmente judia. Sua saúde tampouco era satisfatória e posso dizer também desde logo que era uma mulher que teria merecido um elevador.
Eu devia ter uns três anos quando vi Madame Rosa pela primeira vez. Antes, não temos memória e vivemos na ignorância. Deixei de ignorar com tr
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A primeira coisa que posso dizer a vocês é que morávamos no sexto andar sem elevador e que, para Madame Rosa, com todos os quilos que carregava junto com ela e apenas duas pernas, isso era uma verdadeira fonte de vida cotidiana, com todas as preocupações e mazelas. Ela sempre nos lembrava disso todas as vezes que não ia se queixar em outras bandas, pois era igualmente judia. Sua saúde tampouco era satisfatória e posso dizer também desde logo que era uma mulher que teria merecido um elevador.
Eu devia ter uns três anos quando vi Madame Rosa pela primeira vez. Antes, não temos memória e vivemos na ignorância. Deixei de ignorar com três ou quatro anos e às vezes sinto falta disso.
Havia muitos outros judeus, árabes e negros em Belleville, mas Madame Rosa era obrigada a subir os seis andares sozinha. Dizia que um dia morreria na escada, e todos os pirralhos abriam o berreiro, porque é o que sempre fazemos quando alguém morre. Éramos seis ou sete, ou até mais lá dentro.
No começo, eu não sabia que Madame Rosa cuidava de mim só para receber uma ordem de pagamento no fim do mês. Quando descobri isso, já tinha seis ou sete anos, e para mim foi um golpe saber que eu era pago. Achava que Madame Rosa gostava de mim gratuitamente e que éramos alguém um para o outro. Chorei uma noite inteira por causa disso, e foi minha primeira grande aflição.